Em
19 de Abril de 2011, Pedro Passos Coelho, então candidato a Primeiro-Ministro
para a legislatura que agora está prestes a chegar ao fim, afirmava
categoricamente o seguinte: “... todos aqueles que produziram os seus descontos
e que têm hoje direito às suas reformas ou às suas pensões, deverão mantê-las
no futuro, sob pena do Estado se apropriar daquilo que não é seu”.
Palavras bonitas à época, mas que o tempo, as circunstâncias e os novos discursos abafaram. Hoje, volvidos que são quatro anos, para além da depreciação a que as ditas reformas têm sido sujeitas ao longo da legislatura, a retórica do então candidato deixou de fazer sentido e o tema de mais cortes, voltou a marcar a agenda politica.
Ao
contrário do que se possa pensar, a questão não é nova!... Já em
Dezembro de 2012, o mesmo Passos Coelho, então já na qualidade de
Primeiro-Ministro, havia afirmado que os reformados “estavam a
usufruir de pensões para as quais não descontaram na proporção do
que estão a receber”. Possivelmente – quem sabe – estaria a
referir-se a muitos, que tal como ele, durante anos a fio se
“esqueceram” de depositar nos cofres da Segurança Social os
descontos a que estavam obrigados, provocando um rombo de milhões,
mas que ainda assim, não deixaram de beneficiar das suas pensões,
embora só possíveis, porque a esmagadora maioria dos contribuintes
ali foi injectando mensalmente 34,75% do seu vencimento iliquido,
durante décadas de regime contributivo.
Infelizmente
porém, o alvo deste Governo e ao contrario do que seria suposto
pensar, não são esses tais incumpridores que continuam a
subsistir!... O alvo são pelo contrário os do costume – aqueles
que a tempo e horas, sempre cumpriram com os seus deveres fiscais. E
tanto assim é, que o “tiro de partida” para nova investida, foi
agora dado pela Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, a
qual servindo-se de argumentos idênticos aos do seu chefe em 2012,
achou por bem entender e publicitar, que se nada for feito em termos
de “cortes” das pensões em pagamento, a que pomposamente designa
por mais uma reforma da Segurança Social, esta entrará em ruptura a
muito curto prazo.
Dizê-lo,
afirmou a senhora para quem a quis ouvir, “é uma questão de
honestidade”, adiantando que “o esforço para garantir a sua
sustentabilidade, tem de ser dividido entre os actuais e os futuros
pensionistas”. Para os actuais não foi de modas: 600 milhões de
euros, é o “preço” a pagar já em 2016, conforme Documento de
Estratégia Orçamental aprovado pelo PSD e o CDS e entretanto
enviado a Bruxelas. Para os futuros, as medidas a adoptar ficam a
aguardar por melhor oportunidade.
Esqueceu-se
porém a Ministra, que em nome da dita honestidade e salvaguardando o
facto da dita sustentabilidade ser de facto um problema que tem de
ser objecto de ponderada análise, o mesmo e ao contrário daquilo
que referem os membros e porta-vozes do Governo em vários orgãos de
comunicação social, nunca poderá ser imputado, quer aos actuais
reformados, quer àqueles que para lá caminham a curto prazo. Esse,
é sim um problema que deriva em exclusivo das politicas do Governo,
para quem a Segurança Social nos últimos tempos tem funcionado como
um “pronto socorro”, do qual se serve para daí retirar verbas
para pagar subsidios de toda a espécie, para financiar mordomias
políticas e até para “tapar buracos orçamentais”.
Não
se pretende com isto dizer, que não haverá possivelmente casos em
que o Governo tenha tido conhecimento ao longo da legislatura, de
muitos "turbo-reformados", isto é, de pessoas que
obtiveram pensões ou subvenções vitalícias ou algo análogo, após
meia ou uma dúzia de anos em cargos políticos e/ou de gestores
públicos, de nomeação política, que obtiveram chorudas reformas
ao cabo de um ou dois mandatos desempenhados. Ora perante estes
factos que são por todos conhecidos, teriam toda a razão nos seus
queixumes e até a estrita obrigação de rever o sistema. Porém
sobre isso, o silêncio impera e ninguém ousa levantar o véu. É
muito mais fácil tentar passar demagogicamente a ideia de que as
pensões e reformas são resultado de benesses do Estado, que essas
benesses não podem pôr em causa os direitos das gerações
vindouras, e ocultar de forma deliberada, que quem hoje usufrui das
suas pensões, o fáz em função daquilo que lhe é devido pelo
muito que pagou para o efeito, mercê de décadas de trabalho e
mediante um contrato com o Estado, desde o início da sua vida
activa. Esta é que é a verdade...
Perante
os factos, é pois de bom tom que se diga, não se entender a razão
de ser dessa sanha anti-reformados, muito menos por parte de quem
fala em honestidade e se afirma estar de boa-fé. É que além de
absurda, a medida projectada, é no mínimo injusta. Este Governo ao
aprovar como aprovou o Documento de Estratégia Orçamental, mais uma
vez foi pelo lado mais fácil!...E o lado mais fácil, é ir
directamente ao bolso dos reformados sem pedir licença, esquecendo
que em Portugal já ocorreu uma reforma da Segurança Social em 2007,
a qual para além de alterar os limites da idade da aposentação, à
qual se seguiram os cortes subsequentes à chegada da tróika que
tornaram as pensões e reformas mais “magras”, significou a
título de exemplo e apenas no último ano comparativamente a 2011,
um decréscimo de gastos do Estado nesta área de menos 762 milhões
de euros.
A
chave da sustentabilidade da Segurança Social, não está pois em ir
mais uma vez ao bolso dos pensionistas!... A chave da
sustentabilidade da Segurança Social está sim em colocá-la
efectivamente ao serviço para que foi criada; na criação de
emprego, gerando com isso novos contribuintes; e fundamentalmente na
criação de riqueza. Enquanto a utilização dos seus fundos forem
utilizados para gerir os programas assistencialistas como o subsidio
de desemprego em elevado grau; para tapar buracos dos Orçamentos de
Estado; para pagar pré-reformas, decorrentes da substituição de
trabalhadores efectivos nas grandes empresas por precários; para
injectar na subsidio-dependência; para subsidiar a Formação
Profissional e as chamadas Políticas Activas de Emprego que consome
1,4% do PIB, entre eles o programa Impulso Jovem, que permitem às
empresas contratar trabalhadores a custo quase zero; e mais
recentemente para financiar estágios que custam “pipas de massa”,
é evidente que não haverá Segurança Social que resista.
Mais!...
Quando todo o discurso por parte do Governo e de quem o apoia é de
esperança; quando se afirma que Portugal está hoje melhor, e a
única coisa que parece não ter solução é a Segurança Social e o
respeito devido aos direitos dos pensionistas, tal só tem um
significado: os actuais reformados, esses tais que “comeram o pão
que o diabo amassou”, que “fizeram a guerra”, que fruto da
crise, do desemprego e até da fome, com as suas parcas migalhas se
sustentam a si próprios e em muitos casos aos seus filhos e netos,
vão ser definitivamente deixados para trás. Um desvario que o tempo
não nos permite recordar tamanha desfaçatez.
(Texto
escrito segundo o antigo acordo ortográfico)