
· OS VENCEDORES
António
Costa e o PS conseguiram a tão almejada maioria absoluta, conquistada com um
claríssimo voto útil à sua esquerda e eventualmente também com a transferência
de alguns votos do PSD, obtendo desta forma, a tão desejada estabilidade para
governar. A pressão política das negociações e dos acordos, os bloqueios
ideológicos ou programáticos de terceiros e a necessidade de cedências para
manter o Poder, são a partir de agora, simples conjunturas de um passado
político recente.
Para
trás, ficaram os que contestaram os baixos salários, a educação, a saúde e o
SNS, as pensões e os aumentos dos salários diluídos na significativa e
preocupante inflação e aumento do custo de vida, o desemprego jovem, o défice e
a dívida pública, as cativações, ou os impostos. Foi o povo que assim o quis... e o
povo ainda é quem mais ordena.
·
A DERROTA DA ALTERNATIVA
GOVERNATIVA
Quando,
independentemente da oscilação das sondagens - que não são nenhum monstro como
querem fazer crer, isso sim o reflexo de um determinado momento conjuntural -
em campanha ou não, tudo apontava para uma
vitória de Rui Rio e para uma bipolarização mais efectiva do voto que continua
a marcar um eleitorado ao centro - PS e PSD têm cerca de 71% dos votos e
mais de 85% dos deputados. Certo é, que o Partido Social Democrata ficou
aquém dos objectivos traçados e não conseguiu, ao contrário do PS, capitalizar
o voto útil à sua direita. Apesar do aumento do número de votos expressos e a
variação do número de deputados ser irrelevante, a verdade é que os resultados
registam um fosso muito significativo de quase 14% de diferença para o PS.
Não se pode dizer que Rui Rio não tenha tentado deixar
no ar a possibilidade de podermos assistir a uma inversão no rumo da governação
ou pelo menos, pressionar o PS para uma negociação, desta vez ao centro.
Basta-nos recordar as derivações de estratégia que António Costa se viu
obrigado a fazer durante a campanha e mesmo após a revelação das projecções e
dos primeiros resultados.
Só que ao contrário do PS, que não teve qualquer
problema em "ferir" a sua esquerda - BE e PCP - e assim conquistar o
voto útil, o PSD foi demasiado "fofinho" com a sua direita - IL e CDS
- e sem uma marcação, muito bem definida e inequívoca, relativamente ao Chega.
·
AS SEGUNDAS VITÓRIAS
A
Iniciativa Liberal conquistou de forma muito evidente, o espaço político do
CDS, e minou com as dissidências de alguns "orfãos passistas"
o próprio PSD. Ora estas, foram de facto, as duas grandes vitórias do Liberais:
o aumento expressivo do número de votos e de mandatos, secando o pouco que
restava do CDS, ao mesmo tempo que marcava uma posição na direita do PSD,
transformando-se num hipotético parceiro para eventuais e futuros acordos com o
PSD.
A
outra, por razões mais negativas, foi a explosão do Chega como a terceira força
política no Parlamento. Não que isso, por si só, tenha grande impacto, já que
muito pouco condicionará a governação em maioria dos socialistas. Isso sim,
pelo que esse facto representa. Primeiro, pelo crescimento do pragmatismo
anti-democrático do racismo e da xenofobia entre outros atributos. Segundo,
porque esta subida do Chega tem uma causa endógena. Ela resulta como um voto de
protesto dos eleitores, concretamente dos saudosistas e por isso abstencionistas
que não se revêm neste sistema politico, que se sentem abandonados ou traídos
pelos políticos e pelos Partidos do regime, e que vão atrás dos populismos e da
ilusão. Por último, a ostracização constante, nomeadamente vinda da esquerda - PS,
BE e PCP -, não pelo valor da argumentação obviamente, mas pelo exagero na
referência constante ao Chega, dando-lhe palco e mediatismos desnecessários a
André Ventura, sabendo-se que em política, a vitimização por norma dá os seus
frutos de forma inversa ao desejado. E de tão repetida a máxima do "não
passarão", acabaram mesmo por passar, de tal forma que chegaram - com
os seus extremismos, fanatismos e populismos, sejam eles cívicos ou religiosos
- a terceira força representada na Assembleia da República, infelizmente para a
democracia, para os valores do humanismo, da República e das mais elementares regras
dos direitos humanos.
·
AS GRANDES DERROTAS
O CDS foi manifestamente o maior derrotado. Não propriamente
pelo impacto no panorama geral das eleições, mas pelo impacto que o seu
resultado teve na sobrevivência do Partido e na própria democracia. Ao fim de
quase 50 anos, sendo um dos fundadores da democracia, acabou em descalabro
total e em permanente conflitualidade interna - desde 2015 – que nem as
sucessivas eleições conseguiram apagar. Não se sabendo se o fecho definitivo de
portas poderá vir a ocorrer -esperando-se bem que não - certa é porém, uma
enorme travessia no deserto perante a actual e próxima conjuntura política
nacional, nomeadamente com a tomada de assalto do espaço político do CDS por
parte da Iniciativa Liberal e do Chega.
Quer tudo isto dizer, que toda a direita democrática falhou!...
Desde o PSD ao moribundo CDS, as derrotas ficaram mais pesadas pelo falhanço
colectivo de não terem conseguido alcançar o grande objectivo que era o de
relegar os socialistas para segundo plano, como dar trunfos a liberais e
cheganos. Uma falha que não só permitiu ao PS assegurar sozinho a maioria que o
segura nos próximos 4 anos, como ainda permitir que pintasse totalmente o país
de cor-de-rosa, e manter um Parlamento maioritariamente de esquerda, que PS,
PCP, BE, Livre e PAN asseguram.
BE e PCP são os restantes derrotados!... Não impediram, algum
crescimento da direita; não impediram a maioria do PS; deixaram de ser a
pressão e mediação política sobre o Governo e o PS; e somados tiveram uma perda
de 20 deputados, caindo para níveis de representatividade muito baixos - 5 e 6
deputados, respectivamente. Para além disso, contribuíram igualmente para a
subida do Chega, com o discurso feito nos moldes já referidos. Feitas as
contas, depois do desaire eleitoral nas autárquicas de 26 de Setembro de 2021,
Bloquistas e Comunistas não perceberam - e tentaram sempre inverter o ónus
da culpabilidade - que a maioria dos portugueses, mesmo os da direita e
nomeadamente os dos seus próprios eleitorados e militâncias, não aceitaram
as justificações e os argumentos para o chumbo do Orçamento do estado que
resultou no fim da geringonça e na consequente crise política.
·
OS MODERADAMENTE FELIZES...
Para o PAN e para o Livre, em contextos diferentes - um pelo
alívio de não ter desaparecido do Parlamento e o outro por regressar à
representividade parlamentar - por mais retórica que queiram usar, os
próximos quatro anos serão penosos no caminho político e mediático que têm de
percorrer para as suas sobrevivências políticas. A maioria conquistada pelo PS,
irá mesmo com as promessas dialogantes de António Costa, minimizar o papel da Oposição,
com particular impacto nos pequenos Partidos, principalmente se por força do
regimento da Assembleia da República, nem Grupo Parlamentar constituem. E sendo
assim, estão desde logo limitados na exposição, na capacidade de intervenção e
de posicionamento. Só com um enorme milagre estratégico, ou se algo de
extraordinário acontecer durante a legislatura, PAN e Livre se livrarão da sua irrelevância
política - em termos de expressão de voto e de representatividade
parlamentar, entenda-se.
Para finalizar: quem respirou apesar de
tudo de alívio, foi Marcelo Rebelo de Sousa, ao livrar-se de um sério berbicacho
para empossar um novo Governo. A grande verdade, é que esta maioria lhe tira o
peso e o pesadelo da necessidade e do trabalho árduo para encontrar um consenso
que seria obrigatório para a formação do futuro Governo.
A tarefa está agora facilitada e o fantasma afastado de Belém,
salvaguardando ainda, que os resultados trazem a estabilidade política que
sempre afirmou desejar para o país.
Daqui a quatro anos, haverá mais... do mesmo ou não.